Porque o nosso povo não se rebela? |
Porque o nosso povo não se rebela? Por Plinio de Arruda Sampaio
O artigo de Plinio Arruda Sampaio, intitulado "Por que o povo não se rebela?" foi publicado no Terra e o transcrevo a seguir. É um texto magistral, esclarecedor, contundentemente claro.
Receba PARABÉNS, Sr. Plinio, pela objetividade certeira.
Triste é constatar que é tudo isto mesmo e que vai se perpetuar por muito tempo, ainda. Há algum tempo escrevi neste blog um artigo "Povo Anestesiado?" link: http://compromissoconsciente.blogspot.com/2010/10/povo-anestesiado.html que, agora, através desse texto, recebe um epílogo marcador como ferro em brasa em lombo de boi.
Verdadeiro!
Em 1964 eu tinha 11 anos.
Quando começou a "caçada", nossa família foi acordada, pela madrugada, com os gritos desesperados de uma vizinha, que chorava e pedia por piedade que não levassem seu marido, o vereador Telismar Lemos. Foi em Santo Ângelo - RS. Os filhos pequenos também choravam. Foi um susto e um medo só.
Ninguém soube dele depois. A família se mudou e perdemos o contato. Hoje o 1º RRecMec não tem mais nenhuma bibliografia, nem em Wikipedia. O registro está apagado. Na nossa memória, só o susto e o medo ficaram. Eu também pertenço ao grupo dos "sem padrinho".
O medo e a "gratidão eterna", submissa, são ingredientes que inibem iniciativas e embotam a visão da realidade.
Também no MMS (Movimento Marina Silva) acompanhei o cuidado, o medo, as ressalvas trocadas entre os que se decidiram a publicar um manifesto de repúdio ao aumento dos parlamentares.
Marina, migra para o PSOL! Gabeira preferiu o palanque do Serra. Teus ideais de sustentabilidade, que são também os nossos, com certeza, continuarão sendo conquistados, passo a passo.
Marina se manifesta no ato, sem hesitação, contra o abusivo aumento que os parlamentares se deram. Gabeira, mesmo votando contra, nada declarou. Um líder PRECISA se manifestar. Pensem nisso, marineiros!
Abraços e votos de contínua clareza, como sempre.
Marise Jalowitzki
Porto Alegre - RS - Brasil
Plinio de Arruda Sampaio é presidente da Associação Brasileira de Reforma Agrária - ABRA Foi um dos fundadores do PT - Hoje, no PSol |
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Terça, 21 de dezembro de 2010, 08h17
http://terramagazine.terra.com.br/interna/0,,OI4853582-EI17081,00-Porque+o+nosso+povo+nao+se+rebela.htmlPorque o nosso povo não se rebela?
Plínio de Arruda Sampaio
De São Paulo (SP)
De São Paulo (SP)
Os telejornais estão cheios de noticias das rebeliões que estão acontecendo na França, Inglaterra, Itália e Grécia. Multidões de funcionários públicos, trabalhadores, agricultores, caminhoneiros, ocupam as ruas, bloqueiam estradas, ocupam edifícios públicos em protesto contra cortes em seus direitos.
Por que aqui não acontece o mesmo, sendo que os cortes são muito maiores?
Dois fatores explicam a passividade da nossa gente.
O primeiro deles é a terrível repressão policial sobre os insurgentes. Desde a Inconfidência Mineira, o povo sabe que a repressão dos revoltosos é seletiva: os figurões da conspiração foram deportados; o sargento de milícias foi enforcado, sua cabeça exposta ao público e o terreno da sua casa salgado para que nada jamais voltasse a nascer ali.
Em 1964, os deputados, senadores, governadores, políticos importantes e pessoas poderosas foram cassados e tiveram seus direitos políticos suspensos. Mas, o patrimônio deles não foi tocado, sua família sempre pôde vir ao Brasil, passada a cassação todos tiveram seus direitos restabelecidos e, muitos receberam polpuda indenização. Os líderes camponeses que se rebelaram foram todos assassinados.
O povo observa essas coisas.
O segundo fator da conformidade chama-se "cultura do favor". Roberto Scharwz tratou desse assunto com maestria. Segundo ele, durante os trezentos anos de escravidão, só havia dois grupos sociais organicamente ligados à produção e, portanto, à obtenção de renda (monetária ou sustentada pelo trabalho). Os demais grupos (negros alforriados, mulatos, cafusos, profissionais sem patrimônio, brancos pobres) só tinham duas maneiras de sobreviver: ou por meio de atos ilícitos ou pela proteção de um poderoso.
Surgiram daí o capanga; o mumbava; o cabo eleitoral.
A cultura do favor é uma ética da gratidão. O marginalizado, no sentido daquele que vive à margem dos direitos sociais, que recebe um favor do poderoso está moralmente obrigado a devolver esse favor, a fim de se sentir uma pessoa digna.
Esta cultura atingiu não somente o pobre, mas também o poderoso. Porque sempre há alguém mais poderoso de quem se necessita uma providência - um favor.
Num livro admirável, Ligia Osório de Souza demonstrou que a elite dominante brasileira desenvolveu uma técnica legislativa destinada a evitar que a lei seja aplicada imparcial e universalmente. Toda lei brasileira tem preceitos vagos e confusos para possibilitar o casuísmo. O casuísmo é o favor.
Conta-se até mesmo a anedota do cidadão que pediu um favor a um senador e quando este respondeu-lhe que não podia atender por ser ilegal respondeu: "Mas é por isso mesmo que estou recorrendo ao senhor; se fosse legal, eu protocolaria no balcão da repartição". No Brasil, no balcão só os pobres sem padrinho.
Pois bem, uma população totalmente sem esperança de conseguir que seus problemas sejam resolvidos contentou-se com migalhas e identificou na figura do Lula o poderoso que lhe faz um favor. Seu dever moral é retribuir esse favor e o meio de que dispõe para isto é o voto.
Não adianta nada demonstrar que o governo Lula está metido em falcatruas e que as migalhas distribuídas não resolvem o seu problema. Se dever moral é retribuir o favor.
Plínio Soares de Arruda Sampaio, 80 anos, é advogado e promotor público aposentado. Foi deputado federal por três vezes, uma delas na Constituinte de 1988, é diretor do "Correio da Cidadania" e preside a Associação Brasileira de Reforma Agrária - ABRA
Fale com Plínio Arruda Sampaio: plinio.asampaio@terra.com.br
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Essa lucidez é conversa fiada aos ouvidos dos que se beneficiam da coisa pública e daqueles que se locupletam sobre as fraquezas e necessidades alheias. Existe no Brasil a cultura de salve-se quem puder. O coletivo é apenas um detalhe.
ResponderExcluirO texto é fraco e não representativo do que vem acontecendo no Brasil nos últimos anos. É resultado de um retórica contorcida pela dor da derrota e pela visão miope da realidade. É esta visão miope e "romântica" que infecta a extrema esquerda. Ela sonha com a "grande revolução" que nos salvará do diabo do capitalismo e nos levará à terra prometida do comunismo. É uma visão fundamentalista e religiosa, pois se assemelha àqueles que acreditam na vinda do senhor que lavará nossas almas e nos transportará para o paraíso. Acorda Plínio, acorda PSOL. A luda é de guerrilha, a batalha é no dia-a-dia e os detalhes (ou migalhas) são importantes. Cada passo, mesmo que pequeno, rumo a uma sociedade mais justa, próspera e sustentável, é um grande passo. O governo não foi e não é perfeito. Loge disso! Mas os resultados estão aí, incontestes, como nunca aqui se viu. Mas poderia ter sido melhor? Óbvio! Mas não se pode negar o avanço. É desonesto chamar os avanços conseguidos de migalhas, quando o inímigo (os conservadores e reacionários, a direita raivosa, o capital financeiro nacional e internacional, a mídia) está aí, na luta, tentando inviabilizar o governo. Lamento que vocês da extrema esquerda, mais uma vez estejam perdendo o momento histórico. Não se trata de apoiar o governo incondicionalmente, mas de participar dele para levá-lo mais para a esquerda. Lutar por dentro e não por fora do governo. Vocês leem Lênin, Gramsci, Trotsky, etc, mas não aprendem a lição. Lembrem-se: a guerra é de guerrilha, é de posição. É um jogo de xadrez e não uma pelada de final de semana. Acorda Plínio, acorda Marina, acorda PSOL! O Brasil precisa de vocês!
ResponderExcluirA diplomação de Paulo Maluf, ao apagar das luzes, demonstra que não tivemos mudanças no sentido moral...
ResponderExcluirHouve alguma evolução... mas na sintaxe...
Hoje não usamos mais o termo "capanga". Somos globalizados e usamos o termo "gerente".
A função? Continua praticamente a mesma...
Enquanto os pais continuarem dizendo uma coisa e praticando outra (a "Lei de Gérson" ainda domina o comportamento brasileiro), não teremos crianças prontas para mudar este país.
As crianças que estão aí? Esquece! Olha só como os pais se comportam...
Por vezes, a fala contundente é alvo de críticas sérias. Noutras, o texto é considerado fraco. A interpretação é sinônimo de livre pensar.
ResponderExcluirO importante, mesmo, é que sabemos reconhecer em Marina e Plinio, duas lideranças incontestes e bastante lúcidas.
Abraços a todos!
Telismar Lemos, quando vereador em 1964, na cidade de Santo Angelo, por diversas vezes teve sua residencia invadida pelas aves de rapina do governo repressor, isso perdurou por anos. Foi preso e torturado no quartel militar, lá estavam estudantes a aspirante que se divertiam ao ver os algozes da ditadura toturar, entre os profesores da tortura estavam Reneu Boch, um dos famigerados torturadores nas Missões.
ResponderExcluirEmociona-me receber o filho de Telismar Lemos aqui no blog. Teus gritos de menino também eram os meus gritos, só que eu presenciava (nem tinha mais pai por perto) e tu, era teu pai que estava sendo arrastado.
ResponderExcluirMarcou minha vida para sempre. Imagina a tua, de vocês todos!
Eu soube que, a primeira vez em que ele voltou para casa, após 40 dias de tortura, não tinha mais as unhas e os pés estavam cheios de furos de agulha inflamados.
Teu Pai foi um HERÓI! Mais um dos HERÓIS que este país tão pouco sabe reconhecer!
Emocionadamente, estendo meu abraço e parabéns! Sim, parabéns por ser um Lemos!
O que se dizia, à época, é que a única coisa que os torturadores conseguiram encontrar na casa do vereador Telismar Lemos, foi um disquinho compacto (do tamanho de um CD/DVD atual)onde Geraldo Vandré cantava "P'ra não dizer que não falei de flores!" - Foi a "prova" que "bastou" para que o arrastassem!
Como ainda anseio por um Brasil mais justo!