Não, suicídio de famosos não difere em nada do suicídio de qualquer mortal. Somos pessoas, e somente dois atos nos igualam: o nascer e o morrer. |
Marise Jalowitzki
Interrupção voluntária do ato de viver.
O impacto que uma morte causa é sempre sentido pelos sensíveis. Geralmente, quanto mais próximos, ou o quanto de referência a(s) pessoa(s) foi, maior o impacto. Mas, de que serve a notícia da morte de alguém? Especialmente quando por suicídio, que é a antecipação auto induzida do ato de morrer?
Quando, há anos (2014), veio a notícia da morte de Robin Williams, por enforcamento, pensei várias coisas:
- Como pôde? Um homem com a cabeça dele, tendo feito os papéis maravilhosos que desempenhou ao longo de toda a sua carreira?
- Como pôde? Tendo auxiliado tantas pessoas na reflexão séria sobre a vida e seus reais e importantes valores, como a Compreensão, a Solidariedade, o Entendimento.
- Como pôde? Com aquela cara e sorriso bonito? Com a sua identificação com o que o ser humano tem de melhor...
- Como pôde?
E aí veio o conhecimento de há quanto tempo tomava antidepressivos, lutando com uma doença cujas crises aparecem sem dizer porque, prostrando e entristecendo, retirando a esperança. Com supostos lapsos de memória. E com o agravante de que antidepressivos, quando tomados por um longo período, podem exacerbar os sintomas da doença, potencializando as crises de sofrimento psíquico e desesperança, levando até mesmo ao suicídio. Tá na bula, não é especulação. E vários estudos demonstram isto. Teria Williams sido monitorado, teve acompanhamento médico para analisar seu verdadeiro estado? Não sei. Talvez ninguém tenha esta resposta. E, de que adianta, agora, para ele? Já não está mais conosco. Ponto.
Uma morte por suicídio deixa um oco, pode deixar um sentimento de culpa em alguns que possam se sentir mais ou menos responsáveis, mas, salvo raríssimos casos, tudo é temporário. Até os sentimentos de culpa. Eles passam. Tudo passa. A vida passa.
Os acontecimentos do dia a dia empurram tanto a seguir para a frente, que o tempo de pensar nos mortos é cada vez mais exíguo, mais curtinho, pela própria absorção dos atos e fatos. Viver é um desafio para todos.
E quase todos querem seguir esta jornada até o dia em que serão retirados pela Força que alguns chamam Deus, outros, Destino, outros, Ciclos. Quase todos. Enfim.
O que faz com que alguns desistam, assim definitivamente? Não sei. Também não quero julgar, pois cada um sabe de si.
Agora, Flávio Migliaccio se foi
Encontrado em seu sítio, 85 anos, sozinho, pôs fim à sua vida num dia de maio, com uma carta ao lado, cuidadosamente escrita, lamentando o atual estágio que assola o momento atual.
Lembro de Flávio, especialmente como Xerife, quanto nos divertiu com suas algazarras e intervenções junto ao Shazan. Espalhou muita alegria, passou endorfina pra muita gente através dos risos que provocou. E, ao longo de tantos anos, em papéis altamente notórios, significativos, como Chalita.
O que teria motivado sua morte auto induzida, de verdade, nunca saberemos. Também não sei se ele tomava antidepressivos ou se o que o desmotivou para continuar vivendo foi um cansaço absurdo de tantas coisas que compõem este mundo dos 'homens e mulheres de boa(?) vontade'...
A constatação das sandices humanas pode ter sido o gatilho. A solidão pode ter sido o gatilho. Solidão é um sentimento forte, pesado, que acomete a qualquer um, em alguma etapa de sua vida. As consequências são diferentes de ser humano a ser humano.
Não, suicídio de famosos não difere em nada do suicídio de qualquer mortal. Somos pessoas, e somente dois atos nos igualam: o nascer e o morrer. O medo também acompanha estes dois momentos. Medo é uma estratégia de defesa que fabricamos frente ao desconhecido. Desconhecido que, em ambas situações, enfrentamos sozinhos, ainda que rodeados. É um ato só nosso. É, portanto, um ato solitário. Solidão, de novo. Só que, nestes dois momentos, não depende de nós mudar este sentimento. O nascer, vem. O morrer, ainda quando auto induzido, vem.
Ponto.
Flávio Migliaccio deixou uma carta de despedida, onde mostra, em poucas palavras, tantas verdades de nossos tempos atuais. O lado denso, no qual estamos sendo compelidos a adentrar, sem escolha. Tudo verdade. Não importa quais os verdadeiros destinatários de sua carta. Políticos, conhecidos, sociedade em geral. O que ele traz ali são traços que caracterizam nossa sociedade, traços que nos envergonham, e para os quais ele se sentiu frágil para continuar enfrentando. E que precisam ser transmutados!!!
Assim como com Robin Williams, também com Flávio Migliaccio, escolho, novamente, ficar com o melhor legado.
Em Williams, aquele sorriso tão terno, tão compreendedor e suas lições em tantos momentos.
Em Flávio, o sorrisão, o jeito engraçado, a inquietude que impulsionava, o legado que fez refletir.
Gratidão aos que nos fazem pensar.
Aos que nos fazem rir.
Aos que deixaram nossa alma leve.
Aos que, com sua presença, nos proporcionaram Saúde e Alegria.
Continuemos, nós, em qualquer idade, VIVOS, nossa luta por dias melhores, sempre!
Oro pelos que não conseguem.
Sou a favor da Vida!
Link deste post: https://compromissoconsciente.blogspot.com/2020/05/suicidio-de-famosos-na-terceira-idade.html
Querendo, leia também:
Medicalização - Setenta por cento das Pessoas que usam Antidepressivos Não têm Depressão, diz Estudo
http://compromissoconsciente.blogspot.com.br/2015/02/sertralina-zoloft-e-todos-os.html
Marise Jalowitzki é mãe, avó, sogra, irmã, tia, filha, neta, amiga, cidadã.
Também é educadora, escritora e blogueira. Palestrante Internacional, certificada pelo IFTDO - Institute of Federations of Training and Development, com sede na Virginia-USA. Especialista em Gestão de Recursos Humanos pela Fundação Getúlio Vargas. Criou e coordenou cursos de Formação de Facilitadores - níveis fundamental e master. Coordenou oficinas em congressos, eventos de desenvolvimento humano em instituições nacionais e internacionais, escolas, empresas, grupos de apoio, instituições hospitalares e religiosas por mais de duas décadas.Autora de diversos livros, todos voltados ao desenvolvimento humano. Querendo, veja aqui
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