Por Marise Jalowitzki
Em um de meus artigos, logo que soubre da notícia da morte deste menino, corpinho encontrado 10 dias depois do desaparecimento, escrevi: Que os pérfidos assassinos lavem o chão onde pisam os pequenos órfãos, que lavem as caquinhas dos bebês que lotam os orfanatos, que limpem os vômitos dos pequenos! Amém! Que se faça Justiça!
Mas não foi o que aconteceu. Sim, foram condenados, mas mofam o seu um sexto da pena em presídios e, depois, vão seguir sua vida normalmente, enquanto o pequeno já não existe.
Esta história mexe muito comigo, por várias razões:
Primeiro, por se tratar de uma criança indefesa, maltratada por seu próprio pai e madrasta. Pelo menino ter pedido socorro, inclusive comparecendo sozinho no Conselho Tutelar. A notificação chegou à Promotoria da Infância e da Juventude, a criança iria para a guarda da avó materna, mas o pai pediu uma nova chance de se reconciliar com o filho e melhorar a relação, no que foi atendido. Moradores do município relatavam que a criança muitas vezes não conseguia entrar na casa e ia dormir em casa de amigos e vizinhos. Quando em casa, havia brigas e discussões, os adultos que deviam zelar pela integridade do pequeno, incitando-o a cenas violentas. Vizinhos cediam sua casa, davam alimento e roupas limpas para o garoto poder comparecer à escola.
Esta história tem outras nuances, também, como o suicídio da mãe do menino.
A avó materna do menino nunca acreditou nesta tese, mas morreu antes de poder ter levado adiante o processo. Era a avó materna do menino a que tinha mais posses...
"O advogado Marlon Barbon Taborda, que trabalha para a avó materna de Bernardo, Jussara Uglione, de 73 anos, afirma que, na semana em que a mãe de Bernardo teria cometido suicídio, ela teria procurado advogados para tentar um acordo judicial de partilha com o marido – de quem estava se separando. A minuta de acordo envolvia patrimônio (bens móveis e imóveis) e uma pensão, para ela e para o menino. Um dos valores propostos era 1,5 milhão de reais de indenização a ela, que era sócia na clínica de endoscopia do marido. E pensão de 8.000 reais mensais." (Veja)
A madrasta e o pai nunca quiseram o menino após a morte da mãe, mas tampouco deixaram que a avó ficasse com a guarda do menino.
O pai - médico-cirurgião, dono de uma clínica na cidade de Três Passos - administrava ritalina, risperidona e vários outros psicotrópicos no filho, com o intuito de sujeitá-lo. Como bem sabemos, em uso prolongado, as drogas psiquiátricas só fazem aumentar os sintomas iniciais indesejados, provocando também o surgimento de comorbidades.
No dia do assassinato, a madrasta (que é enfermeira e sócia na clínica do pai do garoto) fez o menino ingerir uma dose enorme de barbitúricos e, a seguir, com o auxílio de uma amiga assistente social (olha a profissão escolhida pelos três, todas de preservação da vida), passou uma dose letal de midazolan (sedativo usado em endoscopias feitas na clínica), tido depois como a causa mortis.
Segundo, Três Passos é uma cidade pacata, pequena, cidade onde morei de meus dois até 12 anos. E meu pai também se chamava Bernardo. Saber destas atrocidades prolongadas é de machucar qualquer um, mais ainda quem tem algum vínculo com o lugar.
Terceiro, moro em Porto Alegre e saber que estas duas mulheres sem Alma - responsáveis diretas pelo assassinato - estão no presídio feminino Madre Peletier, aqui mesmo na capital - e eu passo seguidamente frente a esta instituição prisional - são fatos que incomodam, que não deixam esquecer a crueldade de que esta criança foi alvo, assim como tantas outras, tenham sido mortas por pais ou padrastos, por madrastas ou mães biológicas. A maldade humana é imensa e sempre choca quando se mostra assim, principalmente vitimizando quem não pode se defender.
Durante o processo, o pai manteve sua postura fria. É de impressionar a forma como se expressa, como se fosse incapaz de sentir. E as mulheres choraram, faziam cara de sofrimento. Revoltante.
Iniciativa de Beatificação de Bernardo
Agora, há um movimento na cidade para beatificar o menino que, segundo relatos, tem sido mencionado como sendo o responsável por curas e graças alcançadas. Meu respeito às pessoas que o invocaram em suas preces e foram atendidas. Estas questões de curas espirituais sempre foi algo que me chamou a atenção e creio que deveriam haver mais e mais estudos para esmiuçar o que efetivamente acontece para que a pessoa que fervorosamente ora, receba o socorro pretendido.
Tem tanta coisa neste mundão que ainda não pôde ser explicado. E eu respeito, mesmo sem entender direito.
Um sentimento enorme de pena deste garoto que, quando em vida, era amoroso, carinhoso, estudioso. E os que deveriam acolhê-lo e tornar sua vida feliz, foram não só omissos, como o incitaram a violências (como o caso em que a madrasta põe um facão em suas mãos) e filma... Violências que, felizmente, ele não perpetrou.
Agora, fiéis da Igreja Católica querem santificar o menino.
Sua trajetória aqui na Terra acabou.
Que sua história possa diminuir a feia violência que assola a humanidade.
A Lei Menino Bernardo já foi um avanço. Que venham outras ações que consigam apaziguar a fera indomada que jaz em cada ser humano e que prevaleça a Paz.
Eis a transcrição da publicação divulgada por UOL:
Fiéis relatam milagres e pedem santificação
do menino Bernardo Boldrini
Um grupo de fiéis da Igreja Católica pede a
santificação do menino Bernardo Boldrini, morto aos 11 anos em 2014 pelo pai, a
madrasta e outras duas pessoas em Três Passos, no Noroeste do Rio Grande do
Sul. Pelo menos duas pessoas relatam cura de doença ou graças alcançadas.
As histórias começaram a chegar em outubro deste ano à casa da empresária Juçara Petry, chamada de "mãe" por Bernardo, que doou roupas e o ajudava nas tarefas do colégio.
As histórias começaram a chegar em outubro deste ano à casa da empresária Juçara Petry, chamada de "mãe" por Bernardo, que doou roupas e o ajudava nas tarefas do colégio.
A Diocese de Frederico Westphalen, a 83 quilômetros de distância, disse que ainda não foi comunicada dos casos, o que inviabiliza o início do processo de santificação.
Os supostos milagres
Na primeira carta, escrita em 11 de
outubro, uma idosa de 68 anos contou que foi curada de uma cegueira.
"Desesperada, eu não sabia mais o que fazer. Uma noite eu fui dormir e
sonhei que o Bernardo sentou ao lado da minha cama e mexeu nos meus olhos. Acho
que ele veio me curar, porque eu comecei a enxergar novamente. Eu fiquei muito
feliz e tenho certeza que foi o anjo Bernardo que me curou", descreve a
mulher, moradora de Ijuí, no Noroeste do RS.
No relato, a mulher observa que não conseguia mais ler, o que voltou a fazer após a aparição do Bernardo no sonho. "Eu enxergava sombras e agora enxergo bem. Desculpe, mas eu precisava contar. Ele é um anjo, posso apostar."
Na outra correspondência, de 17 de outubro, foram enviados dois santinhos com uma oração ao menino Bernardo. "Ó Deus, pelo menino Bernardo, que sofreu calado o desamor do pais e maus-tratos da madrasta. Que mesmo sofrendo tinha sempre um sorriso no rosto e um abraço carinhoso para todos, por esse sofrimento e por essa virtude heróica do menino Bernardo, atendei ao meu pedido”.
Foram impressas mil cópias do santinho devido a uma graça alcançada. A carta foi encaminhada por uma mulher de Curitiba, que conseguiu uma cirurgia para o irmão. Nos dois casos, uma nova avaliação médica será feita em janeiro do ano que vem, segundo Juçara.
A reportagem do Uol telefonou para a idosa de 68 anos que atendeu a ligação e, depois da identificação de repórter, ela desligou e não atendeu mais. Em relação a outra mulher, o único contato disponível é pelas redes sociais e, até a publicação dessa matéria, ela não havia respondido as mensagens.
O caminho para a santificação
Conforme o cônego Carlos Alberto Pereira da
Silva, chanceler do bispado da diocese de Frederico Westphalen, os casos ainda
não chegaram à igreja e, por isso, o processo de santificação não pode ser
iniciado. Antes de se tornar santo, é preciso primeiro que seja considerado
servo de Deus, bastando ter "uma vida santa", segundo o cônego. Para
isso, o bispo de Frederico Westphalen, Dom Antonio Carlos Rossi Keller, precisa
notificar a Congregação para as Causas dos Santos, no Vaticano.
Em seguida, será preciso comprovar um milagre
para Bernardo ser considerado beato. Em Três Passos, já há dois beatos por um
processo diferente - por martírio - o que dispensa a exigência de um milagre. O
padre Manuel Gomez Gonzalez e coroinha Adílio Daronch foram mortos em 1924
durante uma emboscada. Na época, o padre fez o enterro de um membro de um
partido e o grupo rival ficou descontente e entendeu o gesto como uma afronta
do padre. "
Para o padre era seu dever enterrar essas
pessoas como parte da cultura cristã", salienta o cônego. No caso de
Bernardo, o chanceler do bispado acredita que não se enquadraria por martírio,
pela morte dele não ter sido provocada por sua religiosidade.
Depois de ser considerado beato, iniciaria
o processo de santificação. Entretanto, seria necessária a comprovação de mais
um milagre. Também é necessário atender a três requisitos: fama de santidade,
vivência das virtudes cristãs em grau heroico e ausência de obstáculos
insuperáveis contra a canonização. O último item, explica o cônego, seria
relacionado a alguma questão política ou disputa, o que não se percebe no caso
de Bernardo. Segundo o religioso, o menino atenderia às três exigências.
"O Bernardo era uma criança totalmente
alegre. Quando eu soube do acontecido e de que como ele vivia, do dia a dia na
casa, a gente dizia: "Não pode ser." Ele era um jovem alegre, tinha
vivência com crianças da catequese, tinha liderança positiva, muito educado,
muito interessado na religião. Era um jovem que tinha vida miserável, mas
conseguia sorrir, tinha otimismo da fé, tinha essa força de Deus. Tinha tudo
para não frequentar a igreja, não era estimulado pela própria casa", conta
o cônego.
“Deus pode utilizar uma criança para operar
milagres, santidade é um bem. Ter uma criança que possa testemunhar vivência da
vida crista é um bem para o povo.”
O assassinato do menino
Bernardo desapareceu em 4 de abril de 2014
na cidade de Três Passos (RS). Ele tinha 11 anos na época. Seu corpo foi
encontrado dez dias depois, em Frederico Westphalen, enterrado às margens de um
rio. Edelvânia, amiga da madrasta, admitiu o crime à polícia e mostrou o local
onde o corpo foi enterrado. O menino morreu depois de receber uma forte dose do
sedativo midazolam.
Em março deste ano, quase cinco anos após a
morte do menino, quatro pessoas foram condenadas pelo crime: o pai, Leandro
Boldrini; a madrasta, Graciele Ugulini; a amiga do casal, Edelvânia
Wirganovicz, e Evandro Wirganovicz, irmão de Edelvânia. O pai foi condenado por
homicídio, e a madrasta por homicídio qualificado. Já Edelvânia foi condenada
por homicídio e ocultação de cadáver, enquanto o irmão dela, Evandro, foi
condenado por homicídio simples e ocultação de cadáver.
Menino Bernardo com sua mãe e avó materna, mais o pet de estimação
Por Marise Jalowitzki
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Por Marise Jalowitzki
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Mais sobre crianças e suas relações e tratamento:
Marise Jalowitzki é educadora, escritora, blogueira e colunista. Palestrante Internacional, certificada pelo IFTDO - Institute of Federations of Training and Development, com sede na Virginia-USA. Especialista em Gestão de Recursos Humanos pela Fundação Getúlio Vargas. Criou e coordenou cursos de Formação de Facilitadores - níveis fundamental e master. Coordenou oficinas em congressos, eventos de desenvolvimento humano em instituições nacionais e internacionais, escolas, empresas, grupos de apoio, instituições hospitalares e religiosas por mais de duas décadas Autora de diversos livros, todos voltados ao desenvolvimento humano saudável. marisejalowitzki@gmail.com
Livro TDAH Crianças que desafiam
Contra o uso indiscriminado de metilfenidato - Ritalina, Ritalina LA, Concerta
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